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Governo Lula suspende cooperação com Peru e concede asilo a ex-primeira-dama investigada por corrupção

A recente decisão do governo brasileiro de suspender a cooperação jurídica com o Peru em casos envolvendo a Odebrecht — e o consequente acolhimento do pedido de asilo da ex-primeira-dama peruana Nadine Heredia — causou forte repercussão tanto no cenário diplomático quanto nos bastidores do Judiciário. A medida, conduzida pelo secretário nacional de Justiça, Jean Uema, é vista por críticos como mais uma demonstração de interferência político-ideológica em temas de interesse jurídico internacional. O jornalista Cláudio Dantas, do site O Antagonista, fez uma análise contundente sobre o caso, apontando o que considera uma “blindagem petista em rede”.

Segundo Dantas, a suspensão da colaboração foi baseada na anulação das provas que sustentaram a condenação de Nadine Heredia e do ex-presidente Ollanta Humala no Peru, decisão que teve origem em julgamento do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal. O mesmo Toffoli que já declarou que os sistemas de propina da Odebrecht (Drousys e My Web Day) eram fruto de uma “armação” com fins políticos. A crítica de Dantas vai além do conteúdo das decisões jurídicas, focando nos vínculos partidários: Toffoli é ex-advogado do PT, assim como Uema e Marco Aurélio Carvalho, este último advogado dos próprios Heredia e Humala e coordenador do grupo Prerrogativas — coletivo de juristas alinhados à esquerda.

A leitura de Dantas aponta que, mais do que uma coincidência jurídica, há uma articulação de interesses ideológicos por trás da decisão brasileira. Para ele, “a decisão de Uema poderia ter saído da caneta do próprio Carvalho”, sugerindo que os atores envolvidos operam como peças de uma engrenagem política unificada. A presença de Carvalho como uma figura central nos bastidores do poder — seja como advogado, articulador político ou líder do grupo Prerrogativas — reforça essa interpretação.

No plano internacional, o Peru representa um contraste que dificulta o uso de certas narrativas que encontraram eco no Brasil. Dantas destaca que a Lava Jato peruana atingiu líderes de todos os espectros ideológicos — esquerda, centro e direita — sem que houvesse o protagonismo midiático ou político de juízes e procuradores, como ocorreu no Brasil. Lá, não houve Sérgio Moro. Tampouco houve capitalização eleitoral do combate à corrupção. Nesse contexto, a tese de “perseguição política” sustentada para justificar o asilo de Nadine Heredia perde força e coloca o chanceler Mauro Vieira em uma situação delicada. Ele deverá comparecer ao Senado para explicar a motivação da concessão do asilo — e, inevitavelmente, responder sobre a suspensão da cooperação jurídica.

O caso revela um dilema de difícil solução: como justificar uma decisão que envolve política externa, cooperação jurídica e combate à corrupção sem que ela pareça ser movida por afinidades políticas? Dantas observa que no Peru o sistema político é caótico, marcado por uma “presidência parlamentarizada” e falta de lideranças populares, mas com um denominador comum: a corrupção sistêmica. Segundo o jornalista, o Brasil, ao interromper a colaboração jurídica com base em julgamentos internos sobre provas e processos estrangeiros, pode estar contribuindo para um perigoso precedente de relativização da justiça internacional.

Por fim, a análise de Cláudio Dantas ressalta que a justificativa dada por Toffoli — de que a Lava Jato brasileira foi uma operação com fins de conquista de poder político — simplesmente “não cola no Peru”. A tentativa de transpor essa narrativa para justificar decisões de política externa, como o asilo concedido à ex-primeira-dama, parece, segundo ele, um movimento arriscado e mal calibrado.

Resta saber se o governo brasileiro conseguirá manter a coerência alegada e sustentar, diante da pressão política e diplomática, que o acolhimento de Nadine Heredia foi um ato de justiça — e não mais um capítulo da politização da justiça.

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