O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem sendo pressionado por ao menos 20 categorias que já fizeram, somente neste ano, algum tipo de redução de trabalho ou decretaram greves em busca de recuperação salarial ou de reestruturação de carreira. A movimentação impactou serviços essenciais em áreas prioritárias, como Educação, Saúde e Meio Ambiente. Após enfrentar dificuldades de diálogo com governos anteriores, servidores federais viram no retorno da gestão petista a possibilidade de negociação, mas vêm encontrando limitações orçamentárias para terem seus pleitos atendidos.
Em 2023, foram registradas 30 greves de servidores federais — três vezes mais do que em 2019, quando Bolsonaro assumiu a presidência —, segundo dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Esse ano, a pressão continua. A greve das escolas e universidades federais, que começou em 15 de abril, será tratada pelo próprio presidente. Segundo informou o colunista Ancelmo Gois, do GLOBO, Lula convocou reitores de universidades para reunião amanhã em Brasília, em que deve abordar a paralisação de professores e técnicos administrativos.
O tema tem municiado a oposição. O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), presidente da Comissão de Educação da Câmara, apresentou na terça-feira um requerimento para a criação de um grupo de trabalho para debater e acompanhar a greve. “Alunos e professores: deixem a cegueira ideológica de lado e cobrem o Lula”, escreveu Nikolas, nas redes sociais.
A área tem duas categorias em greve. Um dos sindicatos de professores já assinou acordo com o governo, mas outros dois negam o entendimento. O caso foi parar na Justiça Federal, que anulou a assinatura do acordo. Já os técnicos administrativos ainda negociam. Uma nova reunião está marcada para a próxima terça-feira. Com isso, 52 universidades e 79 colégios federais estão sem aulas ou com atividades reduzidas. O Pedro II, por exemplo, já estava com o calendário atrasado por conta da pandemia. Um dia depois de recomeçar o ano letivo, aderiu à paralisação em apoio aos técnicos e, assim, os estudantes ainda não tiveram nenhuma aula em 2024.
‘Repressão de demanda’
Segundo o Dieese, as paralisações diminuíram nos governos Temer e Bolsonaro e explodiram em 2022, último ano da gestão bolsonarista.
— Foi ano de eleição — analisa o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, coordenador do Fórum das Centrais Sindicais. — Depois de uma repressão de demanda tão forte quanto nos governos Temer e Bolsonaro, com arrocho salarial, é relativamente normal que as categorias recoloquem suas pautas durante o processo eleitoral. O presidente Lula foi eleito sabendo as demandas das categorias.
Em nota, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos afirmou que a volta do diálogo com servidores representou reajuste linear de 9% ao funcionalismo do Executivo federal, além de aumentos de benefícios nesses dois anos. Dentre as razões para a limitação orçamentária, que impede aumentos maiores, o secretário de Relações do Trabalho, José Lopez Feijóo, argumenta que os recursos têm que atender a todas as necessidades da população, como aumento do salário mínimo, Bolsa Família e investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Do Ibama à Saúde
Sérgio Ronaldo, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal, afirma que a possibilidade de negociação — que existe com Lula e, segundo ele, não ocorria nos governos Temer e Bolsonaro — mobiliza as categorias. Para ele, o governo este ano decidiu fazer negociações pulverizadas, mas tem proposto sempre os mesmos reajustes (a última oferta foi 9% em 2025 e 5% em 2026), o que frustrou os servidores ao não reestruturar as carreiras.
No começo de 2024, servidores do Ministério do Meio Ambiente paralisaram as atividades de campo, mantendo apenas atividades burocráticas. Com isso, nos primeiros meses do ano o número de multas aplicadas na Amazônia caiu 81% em relação ao mesmo período do ano passado. Hoje, Dia Mundial do Meio Ambiente, os trabalhadores do Ibama e de outros órgãos do Meio Ambiente farão uma paralisação geral como protesto.
“Os servidores do meio ambiente enfrentam problemas sérios após 10 anos de abandono pelo Governo Federal. Atualmente, mais de 4.000 cargos estão vagos na carreira. Além disso, os servidores acumulam uma perda de poder de compra que ultrapassa 75% nos últimos 10 anos”, reivindicou em nota.
Já na Saúde a paralisação dos servidores dos hospitais federais é recente. Há 15 dias, eles decidiram cruzar os braços e não atender o que for procedimento eletivo. De acordo com o Sindicato dos Servidores Federais, as unidades estão funcionando com apenas 30% do quadro de funcionários.
Outras categorias como os servidores do Tesouro e da Controladoria-Geral da União, que ainda não declararam greve, estão intensificando as operações-padrão — quando há diminuição intencional dos serviços — e já aprovaram indicativo de greve para junho.
— O governo e representações de trabalhadores estão debatendo, neste momento, uma proposta de regulamentação da negociação no setor público. Com a aprovação dessa legislação pelo Congresso, a negociação coletiva será favorecida e o número de greves deve diminuir — diz a socióloga Adriana Marcolino, técnica do Dieese.
Andamento das atuais negociações
Educação
Status da greve: governo considera a negociação salarial encerrada com professores e dialoga com técnicos.
Reivindicações: técnicos administrativos querem 37% de reajuste em três anos. Já os professores pedem 22% e reajuste do orçamento das universidades de R$ 2,5 bilhões.
Proposta do governo: professores que ganham mais teriam aumento de 13,3% até 2026. Os demais 31%.
Meio Ambiente
Status da greve: servidores aguardam resposta do governo para a última contraproposta apresentada.
Reivindicações: a categoria quer uma reestruturação da carreira com aumentos que dependem do tempo de carreira dos servidores, e melhores condições de trabalho.
Proposta do governo: foi oferecido pelo governo um reajuste de 9% em 2025 e de 3,5% em 2026.
Saúde
Status da greve: uma proposta do governo já foi rejeitada e a categoria aguarda uma nova reunião.
Reivindicações: servidores pedem a reposição da inflação desde 2015, em um total acumulado de 49%, segundo eles, além de melhores condições de atendimento.
Proposta do governo: a primeira proposta foi de 9% para o nível superior e 3,5% para o nível auxiliar.