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Governo Lula repete sigilo de Bolsonaro e trai discurso da transparência, aponta editorial do Estadão

O governo Lula vem acumulando atitudes que contradizem frontalmente o discurso de transparência e comprometimento com a informação pública que marcou sua campanha presidencial. A crítica vem, com contundência, no editorial publicado nesta terça-feira (27) pelo jornal O Estado de S. Paulo, sob o título “Quem deve teme”, que denuncia a sistemática ocultação de dados por parte da atual gestão federal e acusa o presidente de praticar um verdadeiro estelionato eleitoral.

Durante a corrida presidencial, Lula prometeu restaurar a publicidade dos atos estatais e condenou a política de sigilo do governo anterior. “Se é bom, não precisa esconder”, chegou a afirmar durante debate com Jair Bolsonaro. Contudo, o editorial do Estadão expõe que a prática no Palácio do Planalto tem sido o oposto do discurso: o governo petista bloqueou, por mais de um ano, o acesso a cerca de 16 milhões de documentos que antes estavam disponíveis na plataforma Transferegov.br, contendo dados sobre mais de R$ 600 bilhões em transferências da União para estados, municípios, ONGs e emendas parlamentares.

A justificativa oficial para a retirada foi a alegada necessidade de proteção de dados pessoais, conforme a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). No entanto, segundo o próprio parecer da Advocacia-Geral da União, citado pelo Estadão, não havia impedimento legal para manter a publicidade das informações, desde que utilizados mecanismos de anonimização. A decisão de impor o sigilo, portanto, foi política, e não técnica ou jurídica.

O recuo parcial anunciado pelo governo após o desgaste público não elimina o fato central, segundo o editorial: o acesso só foi restabelecido após pressão externa, e não por convicção democrática. Para o jornal, o episódio revela um governo que “subverte, à sua conveniência, o princípio da publicidade”.

O texto também lembra que Lula, ao assumir o mandato, afirmou que a Lei de Acesso à Informação (LAI) havia sido “estuprada” no governo Bolsonaro e prometeu restaurá-la. Dois anos depois, nas palavras do editorial, essa “criança continua sendo violentada – agora, por aqueles que juraram protegê-la”.

Além do caso da Transferegov, o jornal denuncia o aumento de gastos sigilosos no cartão corporativo, a manutenção de sigilos de cem anos, o ocultamento de informações sobre viagens presidenciais e visitas da primeira-dama, bem como relatórios de emendas parlamentares e agendas ministeriais que não são divulgadas dentro dos prazos legais.

Um dos exemplos mais explícitos, segundo o Estadão, ocorreu no Ministério da Justiça, comandado por Ricardo Lewandowski. A pasta negou acesso a estudos e pareceres técnicos que embasaram a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública, sob a alegação de que os documentos ainda são “preparatórios”. O editorial considera essa justificativa um “sofisma”, já que o ato administrativo se encerra com o envio da proposta ao Legislativo, tornando obrigatória a sua publicidade.

Comparando os dados de acesso à informação entre os dois primeiros anos de Lula e Bolsonaro, o editorial destaca que 7,9% dos pedidos via LAI foram negados no governo Lula, contra 7,7% sob Bolsonaro. A recusa por supostos “dados pessoais” também se manteve alta, o que, na avaliação do jornal, evidencia que, embora o governo tenha mudado de cor, não mudou de prática — e em alguns pontos até regrediu.

“Prometer luz e entregar sombras é mais que contradição ou hipocrisia – é estelionato eleitoral”, conclui o editorial.

A crítica do Estadão se soma ao crescente número de vozes que denunciam a distância entre o que o atual governo prometeu e o que de fato vem entregando em termos de transparência, um tema que deveria ser inegociável em qualquer democracia. A repetição dos mesmos vícios de gestões anteriores não apenas frustra expectativas, como mina a credibilidade de quem disse que governaria com a verdade.

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